'A arte sempre
é legítima', diz curador da EAV sobre performance de artista com críticas à
direção do Parque Lage
Ulisses Carrilho comenta, em texto,
pichações de Gabe Passareli, mediadora do Queermuseu

Pichação na parede da EAV -
Reprodução
RIO - Curador da Escola de Artes
Visuais, Ulisses Carrilho respondeu ao protesto da artista Gabe Passareli no encerramento da
exposição “Queermuseu — Cartografias da diferença na arte brasileira”.
Irmã da estudante Matheusa, que era
trans e foi assassinada por traficantes no Rio em abril deste ano, Passareli
era uma das mediadoras LGBTQ+ da exposição. Durante a performance, realizada
diante de Carrilho e do diretor do Parque Lage, Fabio Szwarcwald, Passareli
escreveu frases como "Pense 2 vezes antes de nos expulsar sr. presidente
diretor" e "Escola não é banco. Prédio público".
A equipe de mediadores de que Gabe
fazia parte era formada por 33 pessoas de diversas orientações sexuais e
identidades de gênero. O grupo foi criado para ajudar a contextualizar as obras
do "Queermuseu".
Leia a resposta de Ulisses Carrilho na
íntegra:
A performance é legítima, a arte sempre
é legítima. Assim como os protestos e as críticas também são. Acompanhei a
ação, mas não desde o início, pois estava dentro das Cavalariças. Há muitas
camadas de significado na ação que foi feita: trata da violência colonial, de
como as instituições têm ficado satisfeitas com seus discursos excludentes.
Nosso racismo é estrutural. Há um uso das identidades minoritárias sendo feito
largamente e isso, infelizmente, não é privilégio da arte, mas um movimento
mais complexo, que envolve a imprensa, a publicidade, o entretenimento. O
próprio projeto educativo era uma tentativa de resposta a esse uso dos corpos
estranhos, desviantes, transviados com a pecha de queer mostra, sem convocar a
representatividade. Falamos muito sobre desobediência,
indisciplina, insubordinação, que,
particularmente, em minha pesquisa, são noções muito importantes para atualizar
a própria noção de escola. No entanto, o que mais me emocionou ontem foi o fato
da performance ter sido realizada pela irmã de Matheusa, Gabe Passareli, que
integra o Núcleo de Ação Educativa da mostra. A frase que mais ressoa para mim,
que tive a oportunidade de conhecer a Theusa e a complexidade de pensamento
dela, é a que fala sobre os corpos virarem cinzas. A performance foi feita com
carvão. Entendo a performance como um grito, um grito de insubordinação. Como
sociedade, precisamos escutar esse grito. A própria Gabe falou sobre escuta
quando esteve conosco no fórum, no dia em que palestrou. Fiquei muito
emocionado ao vê-la deitada no chão, coberta de carvão, com os amigos em volta,
como numa vigília, num gesto de cuidado. Essa família perdeu a Theusa por conta
da violência de estadoe não teve a oportunidade de enlutar, velar esse corpo. Esse gesto carrega
a força e a radicalidade de corpos que estão sendo constantemente colocados num
lugar subalterno. Quando lemos uma frase como "escola não é banco",
mesmo que tenha sido escrita de maneira insubordinada, sem pedir autorização
prévia, penso que é preciso que a gente pense sobre ela antes de emitir
opiniões ou acusar um uso errado do espaço expositivo.
Nome: Luísa Antunes Resende
Postagem de artes
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